As situações que chegam ao judiciário ultrapassam os limites da compreensão humana e não podem permanecer impunes: a agressão corporal de crianças e adolescentes, moderada ou imoderada, é inaceitável. A lei procede.
Na forma de “palmadas pedagógicas”, sim ou não, a questão da violência física e psíquica pode ser oportunamente discutida. Já escuto crianças e jovens sugerindo, faceiramente, que tudo podem…
Muitas vezes os educadores se posicionam de forma extremada. Quando agem em função de seus próprios desejos, com tirania e autoritarismo, a contestação é esperada e até desejada. E quando estabelecem alianças com a rebeldia, tendem a se tornar omissos e permissivos, favorecendo a licenciosidade e prejudicando as relações interpessoais. Posições extremadas deixam marcas psíquicas tão ou mais graves que punições corporais.
Por sua vez, o limite entre o compreender e o educar é tênue e exige um exercício de avaliação constante por parte do adulto, a cada novo contexto. Quando um bebê dá um suposto “tapa na cara” do adulto, longe da intenção de macular a sua honra, busca uma forma de comunicação – ainda não civilizada. Cabe ao adulto segurar a sua mão e dizer que não pode. A criança que insiste em colocar o dedo na tomada precisa de um não categórico. De nada valem explicações. Aquela que faz cenas de birra por não ter suas vontades satisfeitas, longe de ser ameaçada e humilhada, pode ser retirada da situação e protegida de sua onipotência infantil.
Reações intempestivas por parte do adulto deixam o pequeno “desentendido” e com uma noção de poder indevida e temerosa. Um jovem que pede autonomia precisa ser escutado com respeito para respeitar pais e professores. E, de preferência, obedecer acordos negociados, mesmo que com reiterados ensaios de rebeldia, para conquistar, aos poucos, a confiança desses adultos. É aconselhável que o adulto possa traduzir em palavras o seu limite e o limite que a situação exige, antes que transborde.
A autoridade exercida com justiça é uma bússola preciosa que se transmite de geração em geração. O direito de se fazer obedecer e a obediência são facilitados quando existe a clareza de que, a rigor, quem manda também obedece, uma vez que elo de corrente maior de transmissão. A palavra, posicionada, dispensa o uso da agressão física. De outra forma, a crença na impunidade permite o vislumbre da animalidade humana e coloca em risco o exercício da cidadania.*
Ana é membro do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae e coordenadora do GAMP – Grupo de Apoio a maternidade e paternidade.
Contato: Anna Mehoudar – www.gampcursos.com.br
Referência Bibliográfica: Autoridade e Autoritarismo – uma Perspectiva Psicanalítica, de Anna Mehoudar e Márcia Arantes, “Jornal Magistratura e Trabalho”, março 2010.